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vidas fugaces

minha amiga morreu por dois segundos.

literalmente.

tinha poucos meses de vida. coisa rápida,

tão rápida que nem percebeu, nem o médico.

antes que pudessem dar falta, voltou.

só souberam por denúncia da máquina a qual estava conectada no hospital.


afinal, dois segundos é coisa rápida. vai assim ó…

pisque por dois segundos e

veja com seus próprios olhos.

nem vê passar, né?


segure a respiração por dois segundos.

dance por dois segundos.

ria por dois segundos.

sorria também.

abrace por dois segundos.

beije por dois segundos.

corra por dois segundos.

coma por dois segundos.

durma por dois segundos.


dois segundos é pouco tempo de vida.

quase não dá para perceber e, quando viu, já foi.


parece que não faz diferença.

mas


dois segundos é muito tempo de morte.

em dois segundos, tudo pode mudar.

é batido. pero es verdad.

não costumo acreditar em frases batidas,

pero que las hay, las hay.


é só se distrair por dois segundos para perder

um sorriso, um olhar, um beijo,

uma borboleta, um ônibus, um ponto ideal do macarrão,

uma vida inteira pela frente,


uma estrela cadente.

que em espanhol é estrella fugaz.

fugaz, que para a gente é a mesma coisa, rápido, célere, ligeiro, feroz.

em bom português: piscou, perdeu.


em questão de segundos - dois ou menos, e passou.

já era.

literalmente.


acho que é daí que vem a ideia a vida passa num piscar de olhos.

de um jeito ou de outro, passa mesmo.

literal ou metaforicamente, passa mesmo.

em tempo corrido ou tempo interrompido, passa mesmo.


a minha amiga morreu por dois segundos, mas voltou e está vivinha por aí.

era bebê e não se lembra. hoje vive como se lembrasse.

como se guardasse o segredo de que a vida passa num piscar de olhos.


sabe que não pode ver todas as estrellas fugaces que passam,

mas está sempre de olho em tudo o que brilha no céu.

afinal não quer perder nem um segundo de vida.


muito menos dois.







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