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por água abaixo

na europa, a água desce pelo ralo girando no sentido contrário.


alguém trouxe essa máxima e saiu. mas deixou a frase com tanta propriedade

que mobilizou por volta de 11 pessoas. estava formada uma junta para análises,

questionamentos e teorias.


só o ralo? e a descarga? na europa inteira ou mais perto do equador?

você não quis dizer no japão?


e o liquidificador, também gira ao contrário?


ah, o liquidificador tem uma ação mecânica e aí não conta, um membro me respondeu.

faz sentido, porém prefiro imaginar que é para o outro lado mesmo que ele vai.


em dado momento, veio uma explicação mais embasada envolvendo rotas náuticas,

desbravadores portugueses, ventos setentrionais, andorinhas, vibradores.

algo assim, uma defesa dificílima de acompanhar. sorri, mas só porque estava

pensando no liquidificador desgovernado.


enfim, o ralo.


a segunda etapa da investigação foi checar a informação. para isso, acionamos amigos

que se envolveram de uma forma mais cotidiana com a vida lá para cima do globo. sem sucesso.


não souberam responder simplesmente porque o sistema operacional do ralo nunca

chamou a atenção de nenhum deles.

aliás, até então, eu mesma e todos da junta tínhamos passado batido por isso também.


e aí, todo nosso empenho na discussão vai por água abaixo. para defender que

do outro lado do equador gira ao contrário, temos que partir do princípio de que sabemos

para qual lado o pequeno rodamoinho roda por aqui. e convenhamos: ninguém sabe.


supondo que alguém da europa me procure para saber mais sobre a realidade dos ralos brasileiros,

eu também não teria como ajudar, poxa-me-desculpe.


ralo também significa fino, escasso. e é exatamente fina e escassa nossa sabedoria sobre o tema.


mas se tem uma sabedoria forte e unânime é a popular. e ir pelo ralo é uma expressão

que roda bastante por aí, pelo menos abaixo do equador é assim. se vai pelo ralo significa

que não deu certo.


mas o ralo.


sabendo ou não sobre o assunto, horário ou anti-horário, sul ou norte, o fato é que as águas rolam.

e a gente só não liga porque são águas passadas.


escovei os dentes com outro olhar nessa noite. fiquei ali admirando a água naquela

pequena coreografia tão embalada que eu quis girar junto. girei. talvez fosse a bebida,

mas vi uma beleza. percebi que nem tudo o que vai pelo ralo é porque deu errado (desculpe, sabedoria popular),

às vezes é só liberação de água parada. e libertar é bonito demais -

para quem fica e para o que segue a correnteza.


o ralo sabe o que faz, a gente não precisa saber.

tem um sentido nisso tudo.


antes de dormir, fiz a etapa final e derradeira da investigação: google. não, a ciranda da água

não varia de um lugar para o outro. isso não tem sentido nenhum.






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