folhas verdes, batatinha, atum selado e ovo perfeito.
nem olhei mais o cardápio e fui nessa!
quem não quer um ovo perfeito?
a gente quer, a gente tenta,
a gente vive essa constante busca pelo
ponto que a gente gosta.
se tivesse deixado 27 segundinhos a mais…
se não tivesse me distraído com a louça...
de vez em quando a gente acerta.
mas logo fiquei intrigada.
ovo perfeito, moça?
ele fica cozinhando pelo tempo certinho.
certinho para quem?
para o chef.
foi aí que fiquei puta.
de uma arrogância se apropriar dos ovos perfeitos.
e ainda definir o meu certinho...
arrogante e petulante.
bacana mesmo é o carro-vendedor que passa aqui na rua com a placa:
"filho do rei do ovo".
não príncipe, filho do rei.
humilde e discreto.
tem também outro filho, agora o da minha prima, que aprendeu a fazer ovo frito e
desde então é ovo frito para cá, para lá, para o café (da manhã ou tarde), para o resto do dia,
da mãe, do irmão, para o chão.
generoso e entusiasmado.
ovo é isso: democrático.
é perfeito (e aí sim perfeito) porque, como já provou o filho da minha prima, vai bem
em qualquer refeição. e é superversátil, né?
frito, cozido, mexido, poché, de chocolate, no pastel, no pão, na salada do chef esnobe, até disfarçado.
que é quando fica escondidinho no meio da carne e atende por bolovo.
ou esparramado-misturado e vira omelete.
colorido é de-boteco.
com farinha de rosca fica empanado.
pequeninho é chato de descascar.
sem cuidado é um puta estrago.
cheiro podre é estragado.
mas sempre o bom e velho ovo. que quebra fácil, mas também quebra um galho
em dias de geladeiras vazias, de horário corrido, de chuva lá fora. santa clara! santo ovo!
já que é de excelência que estamos falando, sua forma é considerada um das mais perfeitas na natureza.
linhas simples sem excessos.
a casca abre sem faca.
mas ainda assim é firme o suficiente para proteger o alimento - e, eventualmente, o pintinho.
funcional e estético. provavelmente um escandinavo foi quem desenvolveu esse protótipo.
vai além do prato, além disso. em portugal, é doce de ovo para todo canto porque as freiras,
de um tempo bem lá atrás, usavam as claras para engomar seus hábitos. aí sobrava gema para dedéu,
que assim começaram a virar pastel. santa clara!
ovo também é sem defeitos na palavra. três letras, dois sons e está resolvido.
mas a magia mesmo está nisso: é um palíndromo! que é quando você pode ler indo ou vindo e dá na mesma,
a leitura é igual.
e aí vem o cara cheio de soberba achar que pode superar o objeto, que já é perfeito por si só?
fora que, se ficar obcecado pela perfeição, todo o resto passa batido (o que dá uma boa gemada, aliás)
e a gente acaba nem curtindo esse monte de coisa que o ovo tem para oferecer.
estamos falando de ovo ou de vida?
(e viu, chef, já fiz ovos melhores por aqui.
e o atum selado podia ter saído do fogo uns 27 segundinhos antes...)
photo by Alexander Andrews on Unsplash
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