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atender bem para atender sempre


_o que é paciência?

_ ãh?!

_… me encher a paciência. por que isso significa ficar nervoso se, ao contrário, você está é justamente

enchendo de paciência?


era meu pai, que me ligou em uma quarta à tarde com essa dúvida. e a discussão durou mais uns quinze minutos. quem mais ou menos ajudou foi o google, mesmo assim não convenceu, nem sempre ele é

a melhor pedida.


(triiiim triiim)

_oi filha...

(meu pai de novo)

_… lembra que você me deu uma havaianas azul?

(não lembro)

_hum, acho que sei. o que tem?

_quando foi que você me deu?

_pai, estamos falando de um chinelo. nem se tivesse te dado um neto eu saberia a data. quiçá um chinelo!

(risos)

_e aquele casaco preto que você trouxe de uma viagem, quando foi?

(aparentemente ele resolveu fazer um inventário das roupas)

_pai, vai ajudar velhinha a atravessar a rua, gasta melhor essa energia aí.


o fato é que isso é recorrente por aqui. minha família me procura para resolver os assuntos

mais aleatórios e inesperados possíveis.


_sabe onde tem uma agência do itaú aqui perto para sacar cheque?

(agora é a minha irmã)


acontece que eu já não moro no mesmo bairro que ela há muitos anos e, portanto, não conheço

mais essas cotidianices das redondezas. e minha agência é bradesco. e por que cargas d'água ela quer

um cheque a essa altura do calendário?


outro dia foi a minha mãe que me ligou para perguntar se minha irmã estava em casa e que horas voltaria. acontece que eu já não moro no mesmo bairro que ela há muitos anos e, portanto, não conheço mais essas cotidianices de casa. e quem mora com a minha irmã é ela mesma, a minha mãe.


teve, ainda, o dia em que minha irmã me ligou de madrugada.

_estão tocando a campainha aqui em casa, quem será?

(quem será? foi exatamente essa a pergunta que ela fez para mim. sendo eu em outra casa, em outro bairro)


enquanto falávamos, toca a outra linha. meu pai.

_filha, estou aqui na porta da sua irmã e ela não atende a campainha. sabe o que aconteceu?


pode voltar e ler de novo, é confuso mesmo. os dois a dez passos de distância, em um conflito

resolvido à distância de um ou dois bairros. de madrugada.


_tal frase tem vírgula?

(meu primo, dessa vez)

_tem. manda ver!

_e por que tem?


perguntas gramaticais são comuns no meu dia a dia, vivem me fazendo. mas essa era uma

consultoria completa: pedia a prática e a teoria. isso porque ele estava em uma discussão no trabalho

para definir o uso ou não da vírgula naquela frase e precisava, afinal de contas, dos argumentos

para ganhar essa parada e esfregar na cara do camarada.


e a vez em que uma amiga, no auge de uma discussão com a mãe sobre qual roupa deveria usar

em um evento importante, parou para me ligar.

_quero tal combinação, ela quer uma outra!!!!!! (estava puta)

_...e resolvi te ligar porque sei que você fala a verdade, qual fica melhor em mim?


assim eu sigo palpitando na vida dos outros, sendo chamada sempre.


esse lance se espalhou e recebi no instagram alguém (que não conheço) perguntando onde tem um

bom luthier aqui pelo bairro. é no meu bairro, finalmente minha área de atuação. mas não exatamente,

já que não toco instrumento algum.


e essa é a minha função de SAC - serviço aleatório ao consumidor. o que eles consomem, no caso,

é o meu tempo. e tudo bem, não me enche a paciência porque estou cheia de paciência por aqui. e se não tivesse, eu falaria a verdade.


quem é o próximo a ser atendido?




photo by mike meyers on unsplash

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